No romance Drácula, de Bram Stoker, a personagem Lucy Westerna se vê cortejada por três pretendentes: Arthur Holmwood, Quincy P. Morris e John Seward.
Ela faz algum drama sobre como é difícil decidir entre eles, mas levando-se em conta que Holmwood é um herdeiro milionário, Morris um caubói do Texas e Seward, um psiquiatra que mora num hospício cheio de maníacos violentos, a escolha final não é nada surpreendente: a senhorita Westenra fica com o mais rico.
Depois o vampiro chega e complica um pouco as coisas, mas isso não vem ao caso. O fato é que nem todas as damas que se veem disputadas por mais de um cavalheiro têm diante de si uma situação tão clara quanto a de Lucy. E é improvável que, mesmo com os recentes dados do Censo — segundo os quais há 3,9 milhões de mulheres a mais que homens no Brasil — esse tipo de situação venha a sumir.
Soluções românticas para o problema abundam nas revistas femininas. Aqui vou sugerir uma saída matemática.
Suponha que a dama em questão tenha dez pretendentes, sendo que nenhum deles apresente uma clara vantagem (seja o único herdeiro de um rico lorde inglês) ou desvantagem (more num manicômio judiciário ao lado da cripta do vampiro) em relação aos demais. Como proceder?
Se ela aceitar o primeiro que formalizar a proposta, sua chance de estar optando pelo melhor de todos será 1/10, ou 10%; se esperar para ficar com o último, novamente sua chance de acabar ao lado do melhor do lote será 10%.
Mas deve existir um momento, ao longo da fila de propostas, onde a probabilidade de acertar dizendo “sim” supere a de acertar esperando mais um pouco. É como se a chance de pegar o melhor candidato fosse descrita por uma curva que começa em 10%, sobe até uma zona máxima desconhecida e depois volta a cair a 10%.
A melhor estratégia parece ser, então, descartar um certo número s de pretendentes, até que a probabilidade de acertar cresça o bastante, e então pegar o primeiro que seja melhor do que todos os que vieram antes.
A determinação do ponto s é importante. Se s for muito pequeno, a escolha será feita num momento em que a chance de o melhor pretendente ainda estar mais para o fim da fila é alta; se for muito grande, haverá um risco considerável de o melhor já ter ficado para trás.
Felizmente, existe uma fórmula matemática pronta para determinar o melhor ponto s, para qualquer número n de pretendentes. Infelizmente, ela é um pouco complicada demais para que eu presente a dedução aqui.
O resultado geral, no entanto, é o seguinte: deixe passar os primeiros 37% e escolha o melhor que surgir em seguida. No caso com dez candidatos, descarte os quatro iniciais e pegue o primeiro que seja melhor que qualquer membro do quarteto original.
Para quem estiver curioso em saber de onde raios vêm esses 37%: 0,37 é um valor aproximado para 1/e, onde e simboliza a entidade conhecida como constante de Napier, número de Euler ou base dos logaritmos naturais.
Trata-se de um número irracional e transcedental, cuja expansão decimal começa com 2,7182818284590452353602874713526624977572470936999595749669… e assim por diante. É um dos números mais importantes do Universo, ao lado de π, i, 0 e 1 (que se relacionam entre si por meio de uma fórmula fantástica, aliás).
E por que e é importante? Existem algumas dúzias de livros que exploram a questão, mas um dos motivos é que se trata de uma constante que costuma aparecer quando cientistas ou engenheiros tentam equacionar processos onde um dado recurso é consumido de forma proporcional à sua quantidade inicial.
Naves espaciais funcionam assim: quanto mais combustível o foguete carrega, mais combustível ela precisa queimar — para deslocar o peso do combustível. É por isso que os foguetes largam os estágios gastos para trás.
Como se fossem, digamos, pretendentes descartados.
Fonte: Carlos Orsi
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