PARECE até de propósito. Enquanto o Senado mergulha em descrédito popular, a Câmara dos Deputados age como se não quisesse ficar atrás no objetivo de revoltar a opinião pública - e eis que se apronta para votar uma escandalosa proposta de emenda constitucional.
Prevista para ser apreciada em plenário dia 09/09 a chamada PEC dos Vereadores pretende aumentar em 8.000 vagas a composição dos legislativos de cerca de 2.000 cidades brasileiras.
Dos 51.748 vereadores que existem atualmente, os municípios passariam a contar com 59.791. Por mera curiosidade, informe-se que os dados oficiais mais recentes, disponíveis na internet, contabilizam em cerca de 13 mil o total dos efetivos da Polícia Federal. Já o número de padres é um pouco maior: 18 mil.
Dado s os baixos padrões de relevância e produtividade que caracterizam o cotidiano dos legisladores brasileiros em todos os níveis - e sendo claro o repúdio que a mera menção da palavra "político" desperta na grande maioria da população-, uma proposta desse tipo jamais seria aprovada se a Câmara dos Deputados se preocupasse em refletir a opinião daqueles a quem diz representar.
A PEC, todavia, tramita e prospera, tendo mesmo despertado espetáculos de comoção e de entusiasmo nos salões da Câmara. Quando aprovada numa comissão especial, em fins de agosto, os presentes à cena prorromperam em salvas de palmas e entoaram o Hino Nacional.
Não eram tantos os deputados presentes naquela comissão: 22 apenas, deliberando às pressas, altas horas da noite. O coro patriótico, entretanto, explica-se: quem acompanhava a decisão era um expressivo grupo de suplentes de vereador, ansiosos por obter o cargo efetivo desde logo -uma vez que a PEC retroage aos resultados eleitorais de 2008.
No Senado, onde a PEC já foi aprovada, tudo ocorreu de forma ainda pior. O projeto originalmente acompanhava o aumento do número de vereadores com um dispositivo diminuindo os gastos dos legislativos municipais. Os senadores consideraram melhor desmembrá-lo, para que a farra fosse completa. De volta à Câmara, a PEC recuperou a forma inicial.
Ainda assim, nenhuma contenção hipotética de despesas justifica o crescimento, este sim concreto e irrevogável, do número de vereadores.
Cabe lembrar que o vício inicial remonta ao aumento do próprio número de municípios no Brasil. Desde a promulgação da Carta de 1988, aproximadamente 1,5 mil já foram criados. Note-se que há mais 800 na fila. Surgem artificialmente prefeituras, Câmaras e órgãos administrativos para todos os interessados.
A bola de neve prossegue com o crescimento dos vereadores. E nada faz crer que a promessa de mais austeridade orçamentária funcione com o algo além de um simples pretexto, reversível rapidamente, para impor à população mais uma afronta, e aos políticos mais um privilégio.
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