terça-feira, 10 de agosto de 2010

Festa da Boa Morte é a atração da semana no Recôncavo Baiano

A cidade de Cachoeira, a 109 km de Salvador, será palco da tradicional festa da Irmandade de Nossa Senhora da Boa Morte, a partir da próxima sexta-feira (13), tendo como o ponto alto no domingo (15) e encerramento na terça-feira (17). A manifestação, que une cultos católicos com manifestações de matriz africana, é considerada patrimônio nacional e recebe milhares de visitantes para acompanhar o ritual das irmãs da entidade religiosa.

A programação inclui cortejo anunciando a morte de Maria, missas em memória das irmãs falecidas, sentinela, missa simbólica de corpo presente e procissão. De todas as festas religiosas da Bahia, a da Irmandade da Boa Morte é considerada a mais importante, mais negra e com maior volume de sincretismo e força feminina no estado.

Nascida em meio às senzalas, há mais de 150 anos, a Irmandade de Nossa Senhora da Boa Morte tinha o objetivo de alforriar negros, ou facilitar-lhes a fuga. A força do grupo se mantém até hoje pelas mãos de quem o conduz: são 23 mulheres afrodescendentes com idade superior a 50 anos. De acordo com Valmir Pereira, porta-voz da Irmandade, a festa tem grande representatividade para a cultura do estado e da cidade de Cachoeira.

Troféu de resistência

“A festa já tem 240 anos, é importante porque veio do movimento abolicionista e reflete a liberdade das mulheres negras para se expressarem, cultuarem, e serem vistas. É o troféu de resistência dessas mulheres e se tornou a maior festa de interação, porque atrai gente de todos os lugares”, disse Valmir Pereira.

O encanto do público e dos fiéis não se resume à importância histórica da festa. As roupas utilizadas pelas irmãs da Boa Morte são um atrativo à parte durante os festejos. O luto pelas irmãs já falecidas é representado pelo branco. E a vestimenta para o ritual simbólico do sepultamento de Nossa Senhora é composta por saia preta, blusa branca bordada e lenço branco no cabelo.

Um xale de veludo, com faces vermelha e preta, é utilizado durante o percurso, com o lado preto voltado para fora. Já na procissão de Assunção de Nossa Senhora da Glória, a face vermelha fica à mostra, em meio à beca, às joias e aos orixás.

Tradição religiosa e política

A festa sagrada tem rituais estabelecidos e seguidos à risca há mais de 150 anos pelas mulheres da Irmandade. No primeiro dia, as irmãs fazem o cortejo com o esquife de Nossa Senhora saindo da Capela D’Ajuda em direção à capela da Irmandade. Lá, é celebrada uma missa em memória das almas das irmãs falecidas, seguida da sentinela e da Ceia Branca, composta por pão, vinho, peixes e frutos do mar, sem dendê.

No segundo dia, uma missa simbólica de corpo presente abre a programação, seguida da procissão de enterro de Nossa Senhora da Boa Morte. A parte religiosa se encerra no terceiro dia da festa, com missa de Assunção de Nossa Senhora da Glória e procissão percorrendo as ruas da cidade. Logo depois, as irmãs almoçam com convidados na sede da Irmandade e a programação é fechada com samba-de-roda no Largo D’Ajuda.

O lado profano da Boa Morte se dá nos dois últimos dias, este ano na segunda e terça (16 e 17), quando são servidos um cozido e caruru, acompanhados de samba-de-roda, no Largo D’Ajuda. De acordo com o historiador Manoel Passos, a festa é uma confraria que mantém toda uma tradição religiosa e política.

“Esta é uma manifestação sincrética, e é a única Irmandade no Brasil que mantém a tradição. Além disso, a festa da Irmandade da Boa Morte é geradora de fluxo turístico; foi ela quem inspirou o Turismo Étnico e atrai turistas internos e externos”, explica.

Atração turística

Há mais de 15 décadas, a festa ainda atrai visitantes de toda parte, além de ser um atrativo para profissionais do turismo. Este ano, a expectativa é que cinco a seis mil pessoas acompanhem os festejos da Irmandade de Nossa Senhora da Boa Morte.

A funcionária pública Suiá Couto de Castro, 28 anos, foi duas vezes à festa quando fazia curso para guia de turismo. “Achei a parte visual da festa muito bonita, além de ser muito interessante, porque é uma cultura que existe há mais de 100 anos”, diz.

A fotógrafa Tatiana Souza, 34, também já visitou a cidade de Cachoeira durante a festa, e lembra a importância de se manter a tradição. “É preciso conscientizar as pessoas para a importância cultural da Festa da Boa Morte. As irmãs estão morrendo e, infelizmente, a nova geração não tem se preocupado em manter o ritual”, explica.

Um comentário:

  1. O Povo já decidiu: Quando quer, quer mesmo! Para que mais segundo turno? Já chega, tem que acabar com isso; é dinheiro jogado na joça!

    ResponderExcluir