Carlos Orsi, estadao.com.br
Hábitos saudáveis provavelmente são o fator mais importante para se chegar bem aos 80 anos, mas para sobreviver aos 100 é preciso uma boa ajuda do DNA. Isso é o que indica um estudo publicado na edição desta semana da revista Science, no qual pesquisadores americanos e italianos encontraram 150 marcadores genéticos - variações de uma única letra no material genético, espalhadas por todos os cromossomos humanos - cuja presença permite determinar, com 77% de precisão, se uma pessoa é centenária.
"Suspeitávamos há tempos que a capacidade de viver 20 anos ou mais além dos 80 é, em sua maior parte, ditada pelos genes", explicou Paola Sebastiani, professora de Bioestatística da Escola de Saúde Pública da Universidade de Boston e autora do estudo. "E como as pessoas podem envelhecer de tantas formas diferentes, também suspeitávamos que a capacidade de sobreviver a uma idade extremamente alta tem bases muito complexas, envolvendo muitos genes interagindo entre si e com fatores ambientais".
Ela afirma, ainda, que o fato de as 150 variações da DNA encontradas terem permitido identificar centenários com alta precisão, e independentemente de outros fatores, indica que a longevidade excepcional tem forte base genética. "O fato de o modelo não ser perfeito, no entanto, sugere que ambiente e estilo de vida também afetam a capacidade de uma pessoa atingir idades muito avançadas, mas provavelmente com menos intensidade".
As variações, disse Tom Perls, diretor do Estudo de Centenários da Nova Inglaterra e também autor do trabalho, estão espalhadas por aproximadamente 70 genes, e o papel exato de cada uma delas ainda precisa ser identificado em novos estudos. Perls não acredita, no entanto, que as pesquisas futuras venham a produzir um "elixir da juventude".
"Olho para a complexidade deste quebra-cabeças e fico com a forte impressão de que isso não levará a tratamentos que farão com que muita gente se torne centenária, mas sim permitirá adiar o início da manifestação de doenças relacionadas à idade, como o Alzheimer", disse ele.
Paola afirma que uma descoberta "surpreendente" veio da comparação do número de variações genéticas que predispõem a doenças ligadas à idade presente nos centenários e no grupo de controle.
"Descobrimos que os centenários e os controles não diferem muito nesse número. Esse resultado sugere que o que faz as pessoas viverem muito não é uma ausência de predisposição para doenças, mas um enriquecimento na predisposição à longevidade". Ela acredita que as variações que estimulam a longevidade podem, até mesmo, cancelar o efeito das predisposições negativas.
Esse resultado, segundo Perls, põe em dúvida a validade dos testes genéticos que avaliam predisposição a doenças, já que essas avaliações podem estar ignorando a ação protetora dos genes da vida longa.
O trabalho revelou ainda a existência de 19 "estilos" de assinatura genética para longevidade, definidos por diferentes combinações dos 150 marcadores.
"As assinaturas correlacionam-se com diferentes padrões de longevidade excepcional. Por exemplo, algumas correlacionam-se com longa sobrevivência, outras com uma demora no aparecimento de doenças. As assinaturas representam caminhos diferentes para a vida longa", disse Paola.
Perls lembrou que 90% dos centenários que apresentam problemas de saúde relacionados à idade só começam a sentir esses efeitos após os 90 anos.
O estudo, no entanto, não indica se as pessoas que têm as variações genéticas da longevidade contam com algum tipo de imunidade, e por isso poderiam fumar, evitar exercícios ou comer gordura à vontade. "A maioria dos centenários envolvidos no estudo tinha um estilo de vida muito saudável, com uma minoria muito pequena, por exemplo, com o hábito de fumar ou beber", disse Paola.
Os testes genéticos no grupo de controle do estudo revelou que 15% deles têm predisposição para a alta longevidade, uma taxa muito maior que a encontrada na população em geral: em países ricos, a proporção é de um centenário para cada 6.000 pessoas.
"O fato é que 15% da população tem a assinatura genética que eleva a chance de viver até os 100 anos entre 65% e 98%, se essas pessoas não forem atropeladas por um ônibus, não morrerem na guerra, não sofrerem um acidente", disse Perl. "Além disso, boa parte dessas pessoas talvez precise também evitar o fumo e a obesidade".
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