Depois de empunhar por cinco vezes a bandeira do PT como candidato do partido à Presidência da República, Luiz Inácio Lula da Silva passou oficialmente esse bastão à ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff. Ela foi aprovada ontem como a única pré-candidata do partido à sucessão presidencial, a cinco meses da convenção que, pela lei eleitoral, deverá oficializar a candidatura. “Eleger a Dilma para mim é uma das coisas mais importantes do meu governo. O bom é aquele que elege o sucessor para dar continuidade. Eleger a Dilma não é coisa secundária para o presidente da República”, disse Lula, num discurso de 45 minutos estruturado para mostrar que Dilma “é muito mais que a candidata do Lula” e, ao mesmo tempo, marcar a importância dos aliados e apresentar o que considera as qualidades da ministra e do seu governo. Lula pegou todas as críticas que a oposição costuma fazer à ministra — autoritária, estatizante e incapaz de dar um passo sem o presidente — e tentou passar suas qualidades. “Admiro a personalidade dela. Dilma, no auge da crise de 2005, que tinha como objetivo dar um golpe no governo, não deixou de defender as coisas do governo. Ela não fez que nem tartaruga, que esconde a cabeça no casco”, disse o presidente, referindo-se ao apoio que obteve da ministra na crise do mensalão que fez sucumbir parte do primeiro escalão petista à época. Citou, ainda, a expansão do setor estatal de energia, dizendo que “aquilo que não está funcionando, cabe ao governo botar para funcionar”. Em relação ao público feminino, que as pesquisas apontam como o mais resistente à candidatura de Dilma, o presidente aproveitou para fazer um apelo direto: “Mulherada, é uma oportunidade ímpar de irem à luta para fazer valer os interesses de vocês” (leia detalhes na página 3). Quanto ao PMDB, que havia ficado melindrado no dia anterior, por conta do documento do PT não citar explicitamente o partido como aliado preferencial, Lula fez questão de declarar que é de lá que sairá o vice — uma forma de agradar a Michel Temer (PMDB-SP), que quase não compareceu à consagração de Dilma ontem.
Depois de devidamente apresentada por Lula e pelo presidente do PT, José Eduardo Dutra, foi a vez de Dilma assumir o púlpito e o mesmo teleprompter transparente usado pelo presidente da República. Lula fez alguns reparos ao texto, antes da fala da ministra. Retirou frases que considerou repetitivas e pediu para reforçar outras, como o governo de coalizão. Dilma, como o chefe sempre faz, também improvisou — uma forma de mostrar que não é mais a “mulher do powerpoint”, incapaz de dar um passo sem o seu computador portátil. Fez isso ao falar do conselho da mãe, que as pessoas devem se dar o respeito, e ao dizer que prefere “as vozes oposicionistas ao silêncio da ditadura”. Quase chorou quando se referiu a três amigos mortos nos anos de chumbo — Carlos Alberto Soares de Freitas, Maria Auxiliadora Barcelos e Iara Yavelberg.
Poetas
Ela também citou dois poetas: o mineiro Carlos Drummond de Andrade e o gaúcho Mário Quintana. A citação a Quintana e ao Rio Grande do Sul foi acompanhada da lembrança do tempo em que foi “acolhida pelos gaúchos, generosos, solidários, insubmissos como são os gaúchos”, elogios diretos à parcela do eleitorado em que a candidatura da ministra não retirou a vantagem tucana. Aproveitou, ainda, para pincelar o programa de governo que pretende apresentar nas áreas de saúde, para a qual pede reforço de verbas e melhoria da gestão; na educação, e nesse quesito já se preparou para responder às críticas de inchaço da máquina federal, ao defender a contratação de professores. Sem entrar em detalhes, acenou pela manutenção da política econômica, equilíbrio fiscal, câmbio flutuante, controle da inflação e política de juros.
O longo discurso, no entanto, ainda não foi considerado o melhor que os militantes esperam de Dilma. O vice-presidente da Câmara dos Deputados, Marco Maia (PT-RS), na lateral do palco, não segurou alguns bocejos. Ele estava do lado do antecessor de Dilma, o ex-ministro José Dirceu, aplaudido quando citado por Lula. Ali ficaram também os deputados Antonio Palocci (SP), um dos coordenadores da campanha de Dilma, o deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) e o senador Valdir Raupp (PMDB-RO), que acompanharam o presidente do PMDB, Michel Temer, e o líder do partido na Câmara, Henrique Eduardo Alves (RN). Michel não tirou os olhos do telão enquanto Dilma falava. Estudou todos os gestos daquela que pretende ter como companheira de chapa.
Ao fim, Dilma ensaiou alguns passos ao som de um dos jingles que pretende apresentar na campanha, “depois do cara, a gente vota na coroa/a gente quer/ é gente boa (…)”. Ela encarou o refrão com bom humor: “Num determinado ponto de vista, é muito bom ser a coroa”, brincou. Falta muito, no entanto, para Dilma ter no PT o traquejo daquele que empunhou a bandeira de candidato a presidente por cinco eleições consecutivas. O deputado Paulo Delgado (PT-MG) foi direto ao ponto: “Se o PT quiser ajudar, não deve querer um Lula de saias. Ela é mais formal”.
Fonte; jair onofre
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